Há precisamente 50 anos, a 9 de Setembro de 1965, chegou a Lisboa procedente de Angola o paquete VERA CRUZ, da Companhia Colonial de Navegação, com mais um contingente de tropas vindo de África, conforme notícia publicada na edição desse dia do Diário de Lisboa. Na manhã seguinte, 10 de Setembro, foi a vez do ANA MAFALDA, da Sociedade Geral regressar da Guiné com elementos da PSP.
Até 1972 o recurso aos nossos navios de passageiros utilizados como transportes de tropas em regime de fretamento ao Ministério do Exército era corrente. Curiosamente a censura só permitia que a imprensa mencionasse os nomes dos navios nas notícias de regresso de tropas. As notícias de partidas referiam sempre "uma unidade da marinha mercante nacional". Assisti a muitas chegadas e partidas de transportes de tropas. Os navios mais utilizados, quase em regime permanente, eram o VERA CRUZ e o NIASSA. Mas muitos outros fizeram algumas viagens em regime de fretamento militar. A partir de 1972 os militares passaram a ser transportados em aviões Boeing 707 adquiridos para o efeito pelo Estado, o que se traduziu na retirada do serviço do VERA CRUZ e na sua venda um ano depois para sucata.
A excepção foi o transporte de militares para a Guiné que utilizou a via marítima até 1974, participando neste tráfego a partir de 1970 a Empresa Insulana de Navegação, com os paquetes CARVALHO ARAUJO e ANGRA DO HEROÍSMO, para além da CNN e CCN, como os navios NIASSA e UIGE.
Nos dias de chegadas ou partidas de navios com tropas o movimento era muito significativo nas estações marítimas. O acesso às varandas era então gratuito não se cobrando a taxa de 1 escudo habitual. A afluência de gente, verdadeira multidão era uma constante. À época não gostava de ver os navios a transportarem tropas, mas hoje reconheço que os mais de 600 mil militares transportados nos nossos paquetes de 1961 a 1974 foram um elemento importante na operação das frotas pelas companhias de navegação e provavelmente a actividade mais lucrativa associada aos paquetes. Para a história ficou o estigma da Marinha Mercante ao serviço da guerra do Ultramar, e entretanto, acabado o Ultramar, deixaram morrer a Marinha Mercante em poucos anos.
A título de curiosidade não deixa de ter graça a notícia do "passageiro" clandestino que resolveu seguir viagem no VERA CRUZ para Luanda em Agosto desse ano de 1965 e acabou por regressar à origem e fazer a viagem redonda no VERA CRUZ. O rapaz podia ao menos ter escolhido outro navio mais descontraído, logo um transporte de tropas.
Enfim, efemérides e histórias de há 50 anos que cheguei a presenciar.
O VERA CRUZ era uma das glórias da Marinha Mercante nacional. Foi construído para fazer a carreira do Brasil ao abrigo do Despacho 100 de 1945 e entrou ao serviço em 1952, fazendo nos primeiros anos de actividade além da carreira da América do Sul, também a linha da América Central a partir de 1954, diversos cruzeiros turísticos e algumas viagens especiais a Angola. A partir de Maio de 1961 o navio deixou a linha do Brasil e passou a servir como transporte de tropas, fazendo ainda viagens na carreira de Angola e alguns cruzeiros quando não era necessário no serviço de transportes militares.
O VERA CRUZ era gémeo do SANTA MARIA, entrado ao serviço no final de 1953, que fazia também as linhas das Américas do Sul e Central e foi igualmente vendido em 1973 para desmantelar na Formosa.
O ANA MAFALDA era o mais modesto dos quatro paquetes da carreira de Cabo Verde e Guiné construídos em Lisboa na década de 1950 para a Sociedade Geral: ALFREDO da SILVA, ANA MAFALDA, RITA MARIA e MANUEL ALFREDO. Estes navios derivavam do projecto do navio de carga ALEXANDRE SILVA, de 1943, depois melhorados com os gémeos ANTÓNIO CARLOS e CONCEIÇÃO MARIA. A Sociedade Geral pertencia ao Grupo CUF e dispunha da frota mais numerosa, constituída essencialmente por navios de carga, cujas excepções eram os paquetes mistos referidos acima e o AMÉLIA DE MELLO, comprado em 1966 para a carreira de Angola.
Maquete do paquete VERA CRUZ de 1952, um navio imponente, de linhas modernas, construído na Bélgica em 1950-52 segundo projecto desenvolvido em 1949.
Até 1972 o recurso aos nossos navios de passageiros utilizados como transportes de tropas em regime de fretamento ao Ministério do Exército era corrente. Curiosamente a censura só permitia que a imprensa mencionasse os nomes dos navios nas notícias de regresso de tropas. As notícias de partidas referiam sempre "uma unidade da marinha mercante nacional". Assisti a muitas chegadas e partidas de transportes de tropas. Os navios mais utilizados, quase em regime permanente, eram o VERA CRUZ e o NIASSA. Mas muitos outros fizeram algumas viagens em regime de fretamento militar. A partir de 1972 os militares passaram a ser transportados em aviões Boeing 707 adquiridos para o efeito pelo Estado, o que se traduziu na retirada do serviço do VERA CRUZ e na sua venda um ano depois para sucata.
A excepção foi o transporte de militares para a Guiné que utilizou a via marítima até 1974, participando neste tráfego a partir de 1970 a Empresa Insulana de Navegação, com os paquetes CARVALHO ARAUJO e ANGRA DO HEROÍSMO, para além da CNN e CCN, como os navios NIASSA e UIGE.
Nos dias de chegadas ou partidas de navios com tropas o movimento era muito significativo nas estações marítimas. O acesso às varandas era então gratuito não se cobrando a taxa de 1 escudo habitual. A afluência de gente, verdadeira multidão era uma constante. À época não gostava de ver os navios a transportarem tropas, mas hoje reconheço que os mais de 600 mil militares transportados nos nossos paquetes de 1961 a 1974 foram um elemento importante na operação das frotas pelas companhias de navegação e provavelmente a actividade mais lucrativa associada aos paquetes. Para a história ficou o estigma da Marinha Mercante ao serviço da guerra do Ultramar, e entretanto, acabado o Ultramar, deixaram morrer a Marinha Mercante em poucos anos.
A título de curiosidade não deixa de ter graça a notícia do "passageiro" clandestino que resolveu seguir viagem no VERA CRUZ para Luanda em Agosto desse ano de 1965 e acabou por regressar à origem e fazer a viagem redonda no VERA CRUZ. O rapaz podia ao menos ter escolhido outro navio mais descontraído, logo um transporte de tropas.
Enfim, efemérides e histórias de há 50 anos que cheguei a presenciar.
O VERA CRUZ era uma das glórias da Marinha Mercante nacional. Foi construído para fazer a carreira do Brasil ao abrigo do Despacho 100 de 1945 e entrou ao serviço em 1952, fazendo nos primeiros anos de actividade além da carreira da América do Sul, também a linha da América Central a partir de 1954, diversos cruzeiros turísticos e algumas viagens especiais a Angola. A partir de Maio de 1961 o navio deixou a linha do Brasil e passou a servir como transporte de tropas, fazendo ainda viagens na carreira de Angola e alguns cruzeiros quando não era necessário no serviço de transportes militares.
O VERA CRUZ era gémeo do SANTA MARIA, entrado ao serviço no final de 1953, que fazia também as linhas das Américas do Sul e Central e foi igualmente vendido em 1973 para desmantelar na Formosa.
O ANA MAFALDA era o mais modesto dos quatro paquetes da carreira de Cabo Verde e Guiné construídos em Lisboa na década de 1950 para a Sociedade Geral: ALFREDO da SILVA, ANA MAFALDA, RITA MARIA e MANUEL ALFREDO. Estes navios derivavam do projecto do navio de carga ALEXANDRE SILVA, de 1943, depois melhorados com os gémeos ANTÓNIO CARLOS e CONCEIÇÃO MARIA. A Sociedade Geral pertencia ao Grupo CUF e dispunha da frota mais numerosa, constituída essencialmente por navios de carga, cujas excepções eram os paquetes mistos referidos acima e o AMÉLIA DE MELLO, comprado em 1966 para a carreira de Angola.
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Maquete do paquete VERA CRUZ de 1952, um navio imponente, de linhas modernas, construído na Bélgica em 1950-52 segundo projecto desenvolvido em 1949.